Na educação antirracista, formar é preciso

Gabriela del Carmen

“A construção de uma educação antirracista envolve várias dimensões, não apenas os alunos ou o currículo escolar. A comunidade escolar como um todo precisa avançar para que tenhamos um projeto realmente transformador”, afirma Regina Scarpa, diretora pedagógica do Vera Cruz. A escola levou a sério o estudo. Coordenadores e orientadores de diversos segmentos organizaram encontros de formação de professores e funcionários, criando espaços para discutir relações raciais e incentivar o conhecimento teórico-metodológico de assuntos como racismo, preconceito e discriminação racial.

Docentes do 5º ano participaram de uma consultoria com Clélia Rosa, pedagoga, mestre em educação pela Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) e pesquisadora das relações de gênero e raça na educação escolar e familiar. Divididos em pequenos grupos, eles discutiram temas que já eram trabalhados em sala de aula, como deslocamentos populacionais e os diferentes povos africanos, buscando novas formas de valorizar as culturas e abordar cada conteúdo.

“Todos nós já tínhamos estudado a história da África, mas não com o olhar que precisávamos ter. A Clélia nos ajudou a enxergar o assunto com outras lentes e fazer os recortes necessários”, explica Debora Rana, coordenadora do 3º ao 5º ano, o nível 2.  

Debora, assim como outros educadores, fez um curso de extensão no Instituto Vera Cruz, cujo tema central eram as relações raciais dentro das escolas. “Vamos organizar comissões com os professores que participaram do curso. A reflexão será direcionada pela pergunta: ‘o que a gente faz agora, a partir de tudo que já aprendemos?’”. A ideia é mobilizar a equipe a pensar em outras ações e práticas que podem ser implementadas na escola.

A reflexão não se restringia aos momentos formais. Depois dos encontros, os educadores trocavam dicas de livros e textos que aprofundassem as discussões. A lista de leitura inclui Torto Arado, de Itamar Vieira Junior, Um Defeito de Cor, de Ana Maria Gonçalves, Marrom e Amarelo, de Paulo Scott, e Garota, mulher, outras, de Bernardine Evaristo. No dia do professor, a escola presenteou os professores com vale livros para incentivá-los a adquirir obras que abordassem a diversidade e o racismo no Brasil.

Para Angela Fontana, coordenadora do G5 ao 2o ano, o nível 1, os encontros de formação foram importantes para entrar em contato com a sua própria branquitude. “A equipe deu um salto importante. O primeiro passo é reconhecer os seus privilégios e em que lugar social eles nos colocam. Começamos 2022 com muito mais noção da nossa responsabilidade e, ao mesmo tempo, nos sentindo muito mais fortes para seguir em frente”, afirma.


Formação também com os funcionários

Para começar as atividades com os funcionários, a orientadora do 8º ano, Renata dos Santos, apresentou o que era o projeto de educação antirracista do Vera. “Alguns profissionais não sabiam como funcionava o projeto e o que ele significava na sociedade brasileira como um todo”, diz Renata. “Abordamos o fato de o Vera Cruz ter um índice muito baixo de alunos negros, enquanto essas pessoas são a maioria no país e uma parcela significativa da população de São Paulo”, completa.

Os encontros ocorreriam uma vez por mês, cada um com um tema de análise diferente. Em uma das reuniões, os funcionários fizeram uma visita virtual ao Museu Afro Brasil, cujo acervo conta com mais de cinco mil obras das culturas africanas, indígenas e afro-brasileiras, elaboradas desde o século 16 até os dias atuais. A coleção abrange a trajetória histórica e artística desses povos, além das influências que eles deixaram na construção da sociedade brasileira. 

A visita rendeu. “Percebemos que também era importante fazer algo mais sistemático, como um aulão de História para entendermos o contexto dessas culturas e do Brasil”, explica Renata. A orientadora conduziu encontros sobre a história da África, escravidão no Brasil e as religiões afro-brasileiras. “As devolutivas foram muito interessantes, principalmente no encontro das religiões. Muitos funcionários agradeceram e disseram que as aulas os ajudaram a desconstruir alguns preconceitos que eles tinham.”

A formação, é claro, tem continuidade em 2022. “Ter ações para funcionários e professores da escola é o básico para que a educação antirracista contribua positivamente para a formação dos nossos alunos”, conclui Renata.

Luiz Lira

Luiz Lira morou em Pernambuco e lá iniciou o desenho. Ao vir para São Paulo, começou a fazer gravuras ainda criança, quando entrou no Instituto Acaia. Seus estudos tiveram relação com a capoeira, o desenho e a cerâmica; essas três vertentes estruturam o seu fazer artístico hoje. Posteriormente, ingressou no Instituto Criar e fez formação em Cinema. A partir daí, dedicou-se aos estudos para vestibulares em universidades, assim participou do Acaia Sagarana. Lira ingressou na Unicamp e atualmente cursa Artes Visuais.  A experiência universitária faz com que se aproxime de outros grupos de gravuras, como Ateliê Piratininga e Xilomóvel. Também tem contato com Ernesto Bonato, que é um grande artista e pessoa. Trabalha em ateliês compartilhados em Campinas (SP) e suas produções são semeadas em diversos espaços.