A importância e a urgência de uma educação antirracista

Silvane Silva

Segundo dados divulgados pelo Unicef, existem cerca de 57 milhões de crianças e adolescentes no Brasil. Desse total, temos 32 milhões de meninas e meninos negros e 140 mil indígenas. Esses dois grupos somam 54,5% de todas as crianças e adolescentes brasileiros. Das 530 mil crianças de 7 a 14 anos que estão fora da escola, 330 mil ou 62% são crianças negras. 

A maior parte das pessoas tende a acreditar que essa realidade se deve apenas à desigualdade econômica. Porém, é preciso reconhecer que a pobreza e o racismo têm relação histórica no Brasil e que, para diminuirmos essa desigualdade, é imprescindível encarar de frente o racismo estrutural presente em nosso país.

O Núcleo de Pesquisa do Instituto de Ciências pela Infância (NCPI) – composto, entre outras instituições, pela Universidade Harvard – realizou em 2021 uma pesquisa mostrando o efeito do racismo estrutural no corpo e no cérebro das crianças brasileiras negras de até 6 anos. De acordo com este estudo, o racismo impacta no desenvolvimento infantil de maneira muito marcante, alterando a autopercepção, a autoconfiança, a saúde física e mental, as oportunidades para adquirir habilidades e conhecimentos, as relações parentais, o acesso a direitos (como moradia, saneamento básico, alimentação e saúde) e na socialização de saberes (aprendizado).

Certamente para a diminuição dessas desigualdades faz-se necessária uma abordagem intersetorial. Assim, se é certo que a educação sozinha não promoverá todas as transformações necessárias, é preciso afirmar seu papel primordial nesse processo. Por isso, precisamos assumir que o racismo se perpetua também por meio da educação e que nós, educadores e educadoras, podemos ser agentes voluntários ou involuntários dessa permanência. Somente a partir desse reconhecimento poderemos caminhar para a construção de uma educação antirracista.

O curso de pós-graduação em Educação Antirracista do Instituto Vera Cruz tem como objetivo estruturante contribuir para a formação de professores e demais profissionais da educação a fim de atuarem na construção de uma educação antirracista. A partir da análise de dados sociais e econômicos que evidenciam a desigualdade entre brancos e negros no Brasil e à luz do estudo das políticas de ações afirmativas, os alunos e alunas construirão, ao longo do curso, repertório teórico e conceitual para compreenderem as relações entre os conceitos de branquitude, privilégio branco, colorismo e passabilidade e para identificar como as estruturas sociais se expressam com base na racialidade. Esperamos evidenciar que é papel da escola desenvolver concepções educativas e estratégias pedagógicas que permitam a interação entre sujeitos com identidade culturais diversas, favorecendo o enfrentamento de conflitos e a superação de estruturas socioculturais geradoras de discriminação étnico-racial e exclusão.

O racismo prejudica toda a sociedade e silenciar não fará o problema desaparecer. Como afirmou a especialista Eliane Cavalleiro, é preciso compreender que o racismo na escola traz consequências para todos os/as estudantes, tendo em vista que estabelece a existência de uma hierarquia racial na sociedade. A educação estruturada em bases epistemológicas colonialistas produz práticas racistas nas quais os/as estudantes negros/as e indígenas aprendem a se sentir inferiores, inadequados nas interações sociais, envergonhados do seu próprio grupo racial. Com isso, têm seu potencial de desenvolvimento comprometido, o que pode levá-los/as ao fracasso escolar. Ao mesmo tempo, continua Cavalleiro, os/as estudantes brancos/as podem ser levados a se sentir superiores tanto intelectual como esteticamente. Esse sentimento pode dificultar o relacionamento com pessoas não brancas, na medida em que elas são percebidas como inferiores. As consequências disso para toda sociedade são a perpetuação do racismo, da violência e a permanência das desigualdades.

Convidamos todas as pessoas a engajarem-se na transformação dessa realidade. Como diz a poesia de Beto Guedes, “vamos precisar de todo mundo pra banir do mundo a opressão”.

*Silvane Silva é coordenadora da pós-graduação em Educação Antirracista do Instituto Vera Cruz. Doutora em História Social pela PUC-SP, atua como pesquisadora e formadora de professores em História e Cultura Afrobrasileira e Africana, Educação para as Relações Étnico-Raciais e Educação Escolar Quilombola

Luiz Lira

Luiz Lira morou em Pernambuco e lá iniciou o desenho. Ao vir para São Paulo, começou a fazer gravuras ainda criança, quando entrou no Instituto Acaia. Seus estudos tiveram relação com a capoeira, o desenho e a cerâmica; essas três vertentes estruturam o seu fazer artístico hoje. Posteriormente, ingressou no Instituto Criar e fez formação em Cinema. A partir daí, dedicou-se aos estudos para vestibulares em universidades, assim participou do Acaia Sagarana. Lira ingressou na Unicamp e atualmente cursa Artes Visuais.  A experiência universitária faz com que se aproxime de outros grupos de gravuras, como Ateliê Piratininga e Xilomóvel. Também tem contato com Ernesto Bonato, que é um grande artista e pessoa. Trabalha em ateliês compartilhados em Campinas (SP) e suas produções são semeadas em diversos espaços.