Um projeto antirracista colaborativo entre Escola Vera Cruz, Escola da Vila e ateliescola acaia

Por Nairim Bernardo e Wellington Soares

“Quem planta tâmaras não colhe tâmaras?”: esse foi o tema da primeira palestra do Seminário Educação Antirracista: Romper Silêncios e Atualizar Fazeres Construtivistas, realizado em parceria entre a Escola Vera Cruz, o Centro de Formação da Vila e o ateliescola acaia em novembro de 2023. As tâmaras são uma fruta de grande importância no norte da África, mas possuem uma peculiaridade: as tamareiras levam de 70 a 100 anos para dar frutos após serem plantadas. “Tâmara é o fruto da empatia e da paciência. A implementação das leis é um pé de tâmara inteiro sendo colhido, é o resultado de uma luta histórica”, destacou Ana Lúcia Silva Souza, professora da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e uma das palestrantes da mesa.

O Seminário teve como objetivo aproximar as três instituições da capital paulista na agenda de educação antirracista e criar pontes de diálogo com outras instituições. “Essas organizações assumiram publicamente um compromisso de luta contra o racismo”, destacou Karina Santos da Silva, do ateliescola acaia. No evento, elas puderam compartilhar um pouco de seus projetos antirracistas e dialogar com participantes de diversas instituições. “Trabalho em uma instituição majoritariamente branca, mas que está com um olhar antirracista e com o pensamento de que esse é um problema de toda a sociedade, não das pessoas negras”, destacou Pablo Soares Damasceno, da Escola da Vila.


Reflexão sobre a branquitude

Parte importante do debate se dedicou a refletir sobre o papel das instituições privadas, cuja comunidade é majoritariamente branca, na luta antirracista. “Todas as pessoas merecem experimentar a doçura que é o letramento racial”, destacou a palestrante Ana Lúcia. “Quem não sabe pode aprender.”

O papel da branquitude, que foi tema de edição anterior da Zum-Zum, tem sido amplamente discutido por diversos pesquisadores e pelo movimento negro. Para os representantes das escolas, é fundamental que famílias, estudantes, educadores e funcionários brancos se reconheçam como parte da luta antirracista. “A formação continuada é o jardineiro desse solo e a ação das professoras são os nutrientes necessários para fazermos essa semeadura que não tem fim”, destacou Juliana Costa, coordenadora do Vera.

Mais do que essa contribuição, os especialistas e educadores também destacaram a importância de garantir a diversidade em todos os âmbitos da escola. “É preciso que a branquitude largue a caneta em cima da mesa. Como diz o ditado: Nada de nós sem nós”, reforçou Ana Lúcia.

“É preciso que a branquitude largue a caneta em cima da mesa”, afirmou Ana Lúcia, da Universidade Federal da Bahia (UFBA).

 As equipes também puderam destacar alguns dos desafios que têm enfrentado na implementação de seus projetos antirracistas, como um aumento no número de denúncias de casos de racismo e a escuta de falas racistas entre as crianças desde a Educação Infantil. Esse crescimento é comum quando o combate ao racismo se torna mais frequente. “Os problemas começam a aparecer e precisamos começar a pensar em soluções”, disse Juliana. “O plano da escola está se encaminhando e são muitos os desafios. Mas a cada dia nos sentimos mais estimulados a segui-lo porque percebemos que conseguimos trazer mais pessoas pra ele”, falou Pablo a respeito do trabalho realizado na Escola da Vila.

Veja, abaixo, a íntegra do painel:

O futuro é ancestral

A mesa de encerramento do Seminário contou com a presença da professora Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva. Petronilha foi membro do Conselho Nacional de Educação, onde também foi relatora do parecer que regulamentou a Lei 10.639 (que tornou obrigatório o ensino de história e cultura africana e afro-brasileira). “A pergunta que a educação para relações étnico-raciais que nos desafia: para qual sociedade eu trabalho? Para qual sociedade a minha ação com as outras pessoas trabalha?”, destacou.

A fala de Petronilha destacou como as relações raciais pautaram o longo percurso de formação do Brasil. “Estamos em 2023 e desde o século 15 está sendo construído um projeto de nação. Não vai ser em alguns anos que vamos mudar tudo”, destacou sobre os avanços desde a implementação da Lei 10.639.

Petronilha também reforçou a importância de valorizar a diversidade e as diferenças. “A educação das relações étnico-raciais é reconhecer a presença do outro, e isso faz parte de um projeto de nação. Que nação queremos?”, disse. A visão proposta pela educadora tem relação direta com os discursos – hoje já considerados antiquados – de que é preciso buscar a igualdade: “Ainda parece que há um desejo de nos tornarmos todos iguais, mas esse modelo não é o nosso, porque o nosso é diverso. A riqueza está na diversidade”.

Veja, abaixo, a íntegra da fala de Petronilha:

Luiz Lira

Luiz Lira morou em Pernambuco e lá iniciou o desenho. Ao vir para São Paulo, começou a fazer gravuras ainda criança, quando entrou no Instituto Acaia. Seus estudos tiveram relação com a capoeira, o desenho e a cerâmica; essas três vertentes estruturam o seu fazer artístico hoje. Posteriormente, ingressou no Instituto Criar e fez formação em Cinema. A partir daí, dedicou-se aos estudos para vestibulares em universidades, assim participou do Acaia Sagarana. Lira ingressou na Unicamp e atualmente cursa Artes Visuais.  A experiência universitária faz com que se aproxime de outros grupos de gravuras, como Ateliê Piratininga e Xilomóvel. Também tem contato com Ernesto Bonato, que é um grande artista e pessoa. Trabalha em ateliês compartilhados em Campinas (SP) e suas produções são semeadas em diversos espaços.