Por Beatriz Calais
Logo que a professora de inglês, Adriana de Rezende, perguntou aos alunos do Verinha qual era a imagem que eles tinham de uma parade, ela foi surpreendida por uma resposta em comum: no vocabulário dos alunos do segundo ano, as parades tinham relação com os desfiles dos parques da Disney.
“Muitas vezes achamos difícil decolonizar o currículo do inglês, já que esse é o idioma do colonizador, mas por meio do vocabulário conseguimos fazer vários avanços interessantes. Foi o caso dessa atividade, em que pudemos ampliar a visão que eles têm sobre o que é uma parade”, explica a professora. E por mais que a Disney seja muito forte e presente no imaginário popular, Adriana não precisou ir muito longe para começar a explorar o assunto e chamar a atenção dos alunos.
As parades nada mais são do que desfiles ou festividades que reúnem diversas pessoas por um motivo especial — no Brasil, o Carnaval se enquadra perfeitamente ao vocabulário. Sendo assim, a atividade foi iniciada com apresentações sobre a celebração brasileira e sua história de origem. Foi aí que o estudo começou a se aprofundar cada vez mais.
As raízes do Carnaval
Por mais que seja visto como parte da cultura nacional, o Carnaval tem sua origem ligada à Idade Média, com associação direta ao cristianismo. Foi no período colonial, inclusive, que a tradição foi trazida ao Brasil pelos portugueses.
No entanto, ao longo dos anos, a data comemorativa foi ganhando características próprias a partir da influência de outros povos e culturas dentro do país. A construção de sua imagem como uma festa popular brasileira só se consolidou a partir de 1930, quando as parades pelas cidades começaram a ganhar um ritmo próprio muito pautado pelo samba e pelo frevo.
Hoje, Carnaval é sinônimo de ruas lotadas e desfiles por todos os cantos do Brasil, uma verdadeira comoção nacional. Tudo isso os alunos já sabiam, mas um detalhe os surpreendeu durante a pesquisa: a celebração não é exclusivamente brasileira. “É uma cultura mundial que tem relação com religiosidade e diferentes comemorações de acordo com povos distintos”, destaca Adriana.
Descobrindo outros carnavais
Pensando nisso, a professora auxiliar do primeiro ano, Ana Celia Leitão, emprestou para a turma uma revista que falava sobre o Carnaval na região de Bijagós, em Guiné-Bissau. A partir dessa contribuição, um universo de aprendizados nasceu em sala de aula. “O Carnaval deles tem uma semelhança enorme com o nosso”, conta a professora.
Mais do que isso, a festividade, conhecida como Carnaval do Nturudu, representa uma das maiores manifestações culturais de Guiné-Bissau — uma verdadeira comoção nacional, assim como acontece no Brasil. Comemorada anualmente entre fevereiro e março, a festa é um verdadeiro palco para expressões culturais e artísticas de diversos grupos étnicos presentes no país africano. Para uma nação que se tornou independente de Portugal apenas em 1973, os desfiles ganham um ar ainda mais significativo.
A atividade, que nasceu com um simples questionamento sobre o significado de parade, tornou-se um momento de reflexão para os alunos, que percebiam uma semelhança clara entre os dois países pelas danças, ritmos e acontecimentos históricos relacionados às duas festividades. Em um certo ponto do estudo, no entanto, tudo ficou ainda mais surpreendente.
Após as pesquisas, os estudantes produziram murais e cartazes que apresentavam diversas festividades ao redor do mundo. Em uma das fotos sobre o Carnaval do Nturudu, uma mãe de aluno que é da Guiné-Bissau reconheceu uma amiga de longa data. “Foi uma grande surpresa e nos ajudou a aproximar ainda mais a sala de aula da atividade”, diz ela.
Da Índia aos Estados Unidos, a semelhança na diversidade
Outras parades foram citadas ao longo da pesquisa, como o Mardi Gras, em Nova Orleans, nos Estados Unidos, e o Holi Festival Parade, na Índia. Mesmo assim, parece que o que realmente fascinou os alunos foi a semelhança entre esses carnavais ao redor do mundo. “Alguns associaram o que estávamos aprendendo com a cultura da Bahia. Realmente era parecido, então eles mergulharam fundo no tema. Eles chegaram a batucar em sala de aula para deixar a experiência ainda mais imersiva”, lembra Adriana.
A participação da classe ao longo da atividade foi motivo de orgulho da professora. “O inglês é uma ferramenta que nos possibilita estar e se comunicar com qualquer lugar do mundo, mas ainda assim é difícil trabalhar um currículo antirracista a partir dessa matéria. Quando vi as crianças batucando na sala, percebi que trabalhar um vocabulário tão simples quanto parade havia sido uma ótima escolha”, diz.
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