Muito além do racismo de Monteiro Lobato

Gabriela Del Carmen

Grandes nomes da literatura brasileira que marcaram gerações com suas obras pré-modernistas, Monteiro Lobato e Lima Barreto estiveram no centro das discussões nas aulas do Ensino Médio ao longo do primeiro semestre deste ano.

Os trabalhos começaram com a leitura do conto Negrinha, de Monteiro Lobato, buscando analisar o enredo, a construção das personagens e o gênero da obra. “É um conto que ajuda a perceber como o racismo se manifesta, não apenas nas descrições da protagonista, mas nas relações hierárquicas entre os sujeitos e nos juízos de valor que o narrador emite sobre as personagens”, afirma Vaniery Amorim, a Vany, professora de Língua Portuguesa, Literatura e Redação da 3a série.

A discussão abriu espaço para debater tópicos desafiadores: é possível separar o autor da obra? Como enfrentar questões importantes da atualidade olhando para escritores importantes da história? Seria Monteiro Lobato apenas o retrato de um homem da época? Os temas em questão são apenas problemas do passado?

“Os estudantes fizeram as suas próprias análises, desenvolvendo reflexões pautadas em três grandes olhares: o texto literário, o contexto da obra e as possíveis conexões com outras produções literárias”, explica Vany. As reflexões foram amparadas pela leitura das críticas literárias escritas por Marisa Lajolo, José Vicente e Lilia Schwarcz – além do conto Negrinha! Negrinha! Negrinha!, de Ana Maria Gonçalves, escrito como resposta à obra de Lobato.

A turma aprovou o percurso metodológico. “Achei o trabalho muito interessante, porque foi possível encontrar características para compararmos com o contexto de hoje e para fazer uma análise mais profunda do que simplesmente dizer se Monteiro Lobato é ou não racista. Ver quais eram os elementos e trazer essa questão com fundamento, percebendo que não era simplesmente uma crítica da sociedade de hoje. Gostei de fazer essas análises”, diz Clara Ferla de Almeida, da 3a série.


Entendendo e celebrando Lima Barreto

Em busca de outras vozes que também evidenciassem a complexidade de ideias e valores da sociedade da época, os estudantes analisaram as obras de Lima Barreto. “Esse autor, diferentemente de Lobato, é conhecido por seus posicionamentos políticos. Sua obra se destaca por dar voz às populações tidas como marginalizadas no período. Ele próprio era negro e, como característico da história dos intelectuais não brancos da sociedade brasileira, passou por um processo profundo de branqueamento e apagamento de suas raízes étnicas e culturais”, explica Vany.

Para iniciar as discussões, os alunos leram a obra Lima Barreto – triste visionário, um estudo de Lilia Schwarcz que investiga as origens e a trajetória do escritor carioca sob a ótica racial. Depois, organizou-se uma leitura compartilhada da coletânea de contos do autor tendo como focos o estilo, os temas tratados e a pertinência contemporânea de Lima Barreto. Cada aluno escolheu um conto diferente e compartilhou em aula suas interpretações.

“Achei muito interessante porque ele era um escritor bem militante, que fazia muitas críticas à nossa sociedade. Isso é muito legal – estudar e aprofundar para perceber que havia escritores que mostravam a realidade brasileira e não só glorificavam ou falavam apenas das elites”, conta Ana Luisa Mustafa Campos, da 3a série.

Aprofundando as reflexões, os jovens utilizaram o conto analisado como base para criar um novo texto – inspirado, continuado ou baseado na obra de Barreto. Os estudantes vão compor um livro coletivo que visa a celebrar a memória do escritor neste ano que marca o centenário de sua morte.

Luiz Lira

Luiz Lira morou em Pernambuco e lá iniciou o desenho. Ao vir para São Paulo, começou a fazer gravuras ainda criança, quando entrou no Instituto Acaia. Seus estudos tiveram relação com a capoeira, o desenho e a cerâmica; essas três vertentes estruturam o seu fazer artístico hoje. Posteriormente, ingressou no Instituto Criar e fez formação em Cinema. A partir daí, dedicou-se aos estudos para vestibulares em universidades, assim participou do Acaia Sagarana. Lira ingressou na Unicamp e atualmente cursa Artes Visuais.  A experiência universitária faz com que se aproxime de outros grupos de gravuras, como Ateliê Piratininga e Xilomóvel. Também tem contato com Ernesto Bonato, que é um grande artista e pessoa. Trabalha em ateliês compartilhados em Campinas (SP) e suas produções são semeadas em diversos espaços.