Por Cristiane Tavares e Estúdio Voador
A Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) anunciou que Acra, em Gana, será a Capital Mundial do Livro em 2023, promovendo uma série de eventos e programas ao longo do ano. A FTD Educação celebra a notícia com o lançamento de Mesmo quando sua voz falhar, escrito pela ganense Ruby Yayra Goka. Para a autora, a cena criativa de Gana está em ascendência e tem revelado muitos artistas emergentes que estão se expressando de maneiras brilhantes. “Só no país existem mais de cinquenta dialetos e cada um deles está entrelaçado com diversas práticas culturais. Eu amo ver que as pessoas estão contando suas histórias com as próprias vozes”, diz Goka.
Com domínio narrativo, linguagem ágil e um enredo envolvente, a autora oferece aos jovens leitores a oportunidade de refletir sobre aspectos culturais e econômicos que determinam relações opressoras e violentas contra a mulher, sobretudo em sociedades de histórico colonialista, marcadas por profunda desigualdade. Para Goka, o livro narra uma história universal, que representa toda jovem nascida em uma família pobre de qualquer lugar do mundo onde haja injustiça social. E, por isso, os leitores podem se identificar com as esperanças e aspirações de Amerley, mas também se conectar com a falta de respeito de meninos e homens em relação a meninas e mulheres, seus corpos e suas opiniões.
Mesmo quando sua voz falhar nasceu após a autora ter escutado no rádio a notícia de que um homem teria abusado sexualmente de uma criança. A vítima contou à mãe, que por sua vez denunciou o crime à polícia. O pai estava viajando, mas quando voltou retirou a denúncia da polícia para resolver o assunto em casa. “Lembro-me de pensar que aquilo não estava certo e desejar que houvesse algo que eu pudesse fazer. Essa sensação permaneceu comigo por muito tempo, e escrever sobre esse fato foi minha maneira de garantir justiça para a sobrevivente do abuso”, conta Goka.
No romance, a protagonista Amerley vive em condições precárias com sua mãe e duas irmãs mais novas, em um vilarejo pobre no interior de Gana. Com o abandono do pai, que desejava um filho em vez de filhas, a situação da família se torna dramática. Amerley é obrigada a deixar os estudos e assume as despesas da casa, realizando pequenos serviços, principalmente costuras. O cenário muda quando a família recebe a visita de uma parente rica, Tia Rosina, que oferece à Amerley-mami, a mãe, uma quantia em dinheiro suficiente para que possa abrir um pequeno comércio local e pagar o que deve de aluguel. Em troca, a primogênita Amerley deve seguir com a mulher para a capital e trabalhar por dois anos como empregada doméstica.
O contraste socioeconômico entre as duas realidades não deixa de surpreender Amerley um minuto sequer em sua nova vida. Ela faz amizades com os outros funcionários da casa, segue costurando nas horas vagas e começa uma animada parceria com Priscilla, a outra empregada doméstica com quem trabalha, oferecendo serviços de costura para uma pequena clientela, o que lhe possibilita comprar uma máquina de costura e vislumbrar a proximidade de realizar seu sonho de estudar na Escola de Costura. Além disso, os Mills, um casal que frequenta a casa em que Amerley trabalha, desenvolvem uma relação de empatia com ela, que passa a cuidar da filha bebê do casal. Eles a tratam com respeito e são amorosos. É nessa outra acolhedora casa que Amerley conhece o provérbio de onde foi extraído o título do livro: “Fale a verdade, mesmo quando sua voz falhar” — frase que o leitor reconhece quando a protagonista vence um trauma pessoal, conseguindo falar publicamente a verdade sobre fatos violentos que a acometeram, o que muda seu destino e permite a outras mulheres se encorajem a fazer o mesmo.
Mesmo quando sua voz falhar
Escrito por: Ruby Yayra Goka
Traduzido por: Nina Rizzi
Editora FTD Educação
2022
Resenha publicada originalmente no material Livro da Família, da FTD Educação.