Eu sou Jorge de Souza Azevedo, nasci no dia 13 de dezembro de 1978, em uma cidade pequena – que todos se conhecem – chamada Macaúbas, no estado da Bahia. Quando meu pai foi ao cartório me registrar, já fazia um tempo que eu tinha nascido. Ele não lembrava o ano de meu nascimento e em meu registro sou do ano de 1977, mas sempre comemoro o aniversário na minha data de nascimento verdadeira e não do documento. Então esse ano, 2017, comemorarei 39 anos.
Minha casa era muito agitada. Morava em um sítio com meus pais e irmãos. Muitos irmãos! Dez filhos ao todo: sete meninas e três meninos. Sou o antepenúltimo filho. Eu dividia o quarto com meus irmãos, pois nem havia como eu ter um quarto só para mim. Com eles fazia muitas brincadeiras. Uma que eu gostava muito era me esconder embaixo da cama no escuro – um esconderijo secreto. Quando os meus irmãos menos esperavam, pegava no pé de quem estivesse ali, dando-lhe um susto enorme, que fazia a pessoa sair correndo e gritando.
Em nosso sítio criávamos alguns animais e lá no Nordeste não havia muita água encanada ou filtrada, então era preciso caminhar bastante para pegar água. Eu tinha que levar o gado até o lugar que tinha água para matar a sede. Eu ia montado num cavalo, acompanhando o rebanho. Numa tarde, retornando para casa, estava tranquilo na montaria – pois fazia sempre esse percurso, o cavalo sabia exatamente o caminho – até que tomei um grande susto. Ele decidiu fazer uma curva para outro lado, desequilibrei e caí. O cavalo voltou para casa sozinho, enquanto eu tive que voltar a pé. Chorei bastante e fiquei com muita dor do tombo.
Outra coisa que eu me lembro que doeu bastante, foi quando eu e a minha irmã estávamos andando de bicicleta. Tinha uma descida grande, a estrada era de terra, não tinha asfalto. Fomos pegando velocidade. Quando ela viu que lá embaixo tinha areia decidiu desviar, no que eu olhei para trás, nós derrapamos e ela acabou nos derrubando. Foi um tombo feio, passei por cima da minha irmã e ela acabou quebrando o dente.
Na juventude, eu adorava jogar futebol com os meus amigos – eles me apelidaram de Budé. Eu saia de casa mais ou menos três da tarde e só voltava às oito da noite. O campo de futebol ficava perto de casa. Minha mãe ficava brava, gritando da janela de casa meu nome, pedindo que eu voltasse. Também queria que eu me divertisse, mas não até tão tarde.
Uma das histórias mais marcantes para mim, aconteceu no ano de 2001, eu ainda estava na escola, em uma classe com 42 alunos. Eram onze horas da manhã e a professora estava prestes a dar as notas. Estava precisando ir ao banheiro, então pedi a ela.
O banheiro não era próximo da classe, era preciso virar uma esquina e andar uns sete, oito metros para chegar nele. Ao sair da classe e fechar a porta, vi um homem em cima de uma parede alta com as mãos entre as pernas, eu nem imaginava o que ele fazia ali.
Alguns minutos depois, quando estava voltando do banheiro, ouvi um barulho de tiro e o pessoal gritando. Escutei mais um tiro. Veio todo mundo correndo, desesperadamente, na minha direção, para sair da escola. “Tem um cara atirando na escola!” gritavam. “Como vou voltar para sala?” logo pensei. Então corri também. Senti medo.
Depois fiquei sabendo que o homem que estava em cima do muro aproveitou minha saída da sala e entrou. Em sua mão tinha uma espingarda que estava cerrada, bem curta, e mirou na professora, mas na hora em que ele foi atirar nela, a arma pesou na sua mão e o tiro – que demorou para sair – pegou no pé dela. O outro tiro, que saiu pelo pátio, acertou outras pessoas, era chumbinho. Dos 42 alunos que estavam na sala, só eu não presenciei essa cena.
De repente vi o homem correndo para fora da classe, onde tinha uma quadra de esportes. Algumas pessoas não sabiam o que fazer. “Pega ele para não fugir!” Ele saltou pelo muro e subiu uma serra, apoiando-se na torre de tevê. Os policiais foram atrás dele.
Eu já havia visto ele, pois cidade pequena todo mundo se conhece. O caso saiu no Jornal Nacional. Ele já estava planejando fazer isso, mas só depois que ele se matou é que encontraram alguns bilhetes dele falando sobre o acontecido. Por sorte a professora ficou bem, só precisou fazer uma cirurgia no pé.
Desde pequeno eu tinha o desejo de vir para São Paulo, porque meu tio já vivia por aqui – ele me influenciou porque falava muito de um time de futebol paulista – tanto que torço para o São Paulo Futebol Clube, sou são-paulino roxo. Quando minha mãe faleceu, eu já não tinha mais motivos para ficar na Bahia. Realizei meu desejo me mudando para cá como muitos que moram no Nordeste.
Nessa mudança eu precisava de um emprego. Por sorte, a patroa da minha irmã – que já morava aqui em São Paulo – era a Beth, coordenadora da Escola Vera Cruz, que estava prestes a abrir a nova unidade Alvilândia e precisava de um funcionário. Me convidou para trabalhar com ela, e me fez prometer que iria até a minha terra buscar as minhas coisas e voltaria. Desde que eu voltei trabalho na portaria, manutenção, faxina e entregando malotes entre as unidades.
Quando vim morar aqui, deixei lá no Nordeste algumas pessoas importantes: parte da família, amigos, e mais recentemente um amor. Em umas férias que fui visitar minha cidade, conheci a Marly, que hoje é minha esposa.
Eu a pedi em casamento no dia de Natal, numa surpresa que fiz para ela. Levei-a num passeio, num local que sempre as pessoas da cidade vão, perto do rio. Quando fiz o pedido ela se emocionou e chorou, mas eu segurei o choro – só desta vez, porque choro com bastante facilidade.
Estamos casados há um ano, meu desejo é que no futuro eu tenha filhos, quem sabe no final desse ano. E espero conseguir trabalhar na área de segurança do trabalho, pois estou frequentando um curso nessa área.
1 comentário
Gabriela Menezes Gontijo
1 de fevereiro de 2018em 01:15Eu conheço o Jorge dez de pequena mas não sabia nada disso sobre ele