Alice Molina Baracui
Agora ela é a pessoa mais feliz que se pode conhecer, por saber reconhecer em quase tudo algo bom e por não desistir. É a pessoa que concorda com tudo que não seja “ruim”, a pessoa que concordou em contar tantas histórias maravilhosas que serão contadas agora para vocês. Então, vamos começar pelo começo.
Em1947, na cidade de São Paulo (SP), nasceu Elizabeth, a temporã da família, nove anos mais nova que sua irmã. Morou até os quatro anos em um apartamento, quando se mudou para um hotel. No momento achou a ideia diferente e surpreendente e até ficou amiga do ascensorista: mexia em uma manivela dourada que abria a porta de ferro, apertava os botões e batia papo com ele. Depois de um tempo, começou a achar que o lugar era meio pequeno e lembrou que estava morando em um hotel.
Por isso, em protesto por morar lá, jogava canecas, panelas, pratos, pires e copos de brinquedo pela janela. –imagine se caísse na cabeça de alguém, não ia dar certo-
Aos cinco anos se mudou novamente, mas desta vez para um prédio, grande mesmo, de vinte e quatro andares, com dez apartamentos pequenos em cada andar. E ela morava no décimo terceiro. Lá ficou até completar 18 anos. Nesse prédio morava uma menina que todos chamavam de Mariolina. Ela virou sua nova amiga e vizinha.
As duas brincavam de cabaninha com cadeiras, panos, lençóis, colchas e travesseiros. Também brincavam de se vestir com roupas das mães; pegavam vestidos, saias, lenços, cachecóis, sapatos de salto alto e desfilavam pelo prédio.
Aos oito anos e sua irmã com dezessete, tiveram a brilhante ideia de fazer um jornal: O Urro. Ele tinha várias sessões: quadrinhos, piadas, o cantinho da menina moça, que era como se fosse uma página de um diário de uma menina de dez ou onze anos e os filmes da semana, que era uma gozação com alguém, por exemplo; se uma velha passasse a morar no prédio, um dos filmes da semana seria: O dinossauro, e se tivesse um vazamento de um cano que inundava o corredor : O Náufrago- Zelador. E talvez seja por isso que ele sempre arrancava o exemplar que elas colocavam no elevador.
Nas férias todos os dez primos, incluindo ela e sua irmã, viajavam para Campos de Jordão para brincar de inúmeras coisas, mas o que a Beth não brincava era de bicicleta, skate, ou patins. Não por sentir medo (isto também um pouco), mas só por não saber ’’usá-los’’.
Uma idea genial veio na cabeça de Claudio seu único primo de mesma idade, “’você sobe na bicicleta do meu pai e eu vou te segurando enquanto a gente vai descendo a ladeira”. Ela confiou e subiu na enorme bicicleta do tio prestes a descer a rampa mais que enorme, mais que íngreme, sem pensar que era de terra e cheia de pedras. ”Eu seguro, eu não solto’’.- pensava…
Vocês já sabem o que deve ter acontecido: estava tão rápido, mais tão rápido que… Soltou… Agora sim estava rápido cada vez mais, Beth não sabia o que a arrepiava, se era medo, raiva, susto ou qualquer outra sensação. Tanta ação que ela nem percebeu que estava andando de bicicleta. Um jeito rápido e traumático de se aprender.
Ficava hospedada na casa de Claudio e gostava por muitos motivos. Um deles era a brincadeira da carta enigmática: quando ele ia ao mercado, na padaria ou em algum lugar assim, ele deixava uma carta com desenhos flechas, números e desenhos. Essa era uma de muitas brincadeiras que fazia todos que moravam lá ou só estavam um tempo, se divertirem muito. Além de brincar, gostavam de passear pelo cemitério -de dia é claro- por medo de fantasmas, bruxas, múmias ou lobisomens.
Uma de suas paixões sempre foi o carnaval: bloco dos primos, todos com fantasias feitas por sua tia. Guerra de lança perfume (um objeto usado para soltar um cheiro que deixa as pessoas tontas – claro que agora proibiram -), música, carros alegóricos, confete, serpentina, ruas apinhadas de gente animadíssima e com fantasias de todo tipo.
Quase dezesseis anos depois, ela se casou e se formou em Artes Plásticas, anos muito felizes. Alguns anos depois nasceu Joana, sua filha mais velha, e Pedro, o mais novo.
Durante três anos e meio chegavam muito cedo na escola porque Beth era professora de biblioteca. Por vinte e três anos foi professora de Artes e por dez, de teatro.
Os quatro se mudaram para a Granja Viana quando o mais novo completou sete anos. Naquela época, a Granja era bem “rural”, tinha poucas casas, rua de terra e mato, muito mato. Por isso muitas coisas bem diferentes aconteceram. Já conheceu alguém, qualquer um, que teve uma cobra ou aranha de estimação? Vai ver então.
Pedro ficava procurando cobras ou aranhas no mato. Um dia achou uma cobra verde, chamou o pai que a levou para o instituto Butantã. Lá disserem que ela não era nem venenosa nem agressiva, o que a permitia virar um bichinho de estimação. Assim feito, ele a colocou em um aquário e a alimentava com insetos que achava no mato.
Um dia ele voltou de casa e não tinha cobra nenhuma no aquário, entrou em desespero e ouviu a faxineira gritar “Uma cobra, uma cobra!!”. Ele correu para a sala falando para não a matar porque era dele, por pouco “adeus cobra”, pois a faxineira já estava com uma vassoura na mão prestes a matá-la. Não foi dessa vez, mas tempos depois, ela fugiu para o mato.
No mesmo tipo de “caça bicho no mato” ele achou várias aranhas, armadeiras e caranguejeiras, também ficou com elas, mas desta vez, foi diferente porque elas não eram mansas e tinham veneno.
Cobra, aranha, só faltava terem um cavalo, uma onça, ou uma raposa de estimação. Um dia Pedro, Joana e Norberto, seu pai, foram para uma festa e Beth ficou sozinha em casa, começou a ouvir ums barulhos, de quando pisamos no mato. “Será um ladrão?” pensou ela, e os cachorros começaram a latir. Ela chamou a polícia, rapidamente chegaram quatro carros da polícia. Estavam vasculhando todo o terreno de ponta a ponta, quando os três “festeiros” chegaram assustados. Os policiais disseram que a única coisa que acharam foi um cavalo e pediram um saco de supermercado para catar abacates do pé. Os policiais ficaram subindo no pé de abacate as três da manhã, atrapalhando o sono dos quatro que queriam dormir.
No fundo da casa havia uma porta que dava para um jardim muito grande com um muro que o separava do mato. Um dia encontraram no jardim uma raposa do tamanho de um cachorro médio-grande. Quando tentavam chegar perto dela, por medo, ela ameaçava avançar. Por isso tiveram que chamar os bombeiros para pegá-la e a devolver para o mato.
Finalmente o episódio sobre a onça. Quando Pedro estava indo para a faculdade, no caminho do carro, viu uma onça há uns trinta metros de distância, correu para o carro e foi “faculdade a fora”.
Beth estava indo dar aula de Artes Plásticas quando um guarda a parou só para ver os documentos do carro. Como podem imaginar, nada estava em dia. Teriam que apreender o carro dela se não fosse uma conversinha: “eu sou professora, ganho pouco….” “espera, professora aonde?” perguntou o policial “na escola Makenzie, no Butantã ” o guarda falou que sua noiva estudava lá e que o nome dela era Beta. “Beta, ela é minha aluna” disse Beth e completou “se você me multar, eu vou dar nota baixa para Beta” . Ele a liberou e os dois ficaram felizes.
Por falar das alunas, só as mais bem comportadas ganhavam filhotes. Você deve estar se perguntando que filhotes, os filhotes da cadela da Beth, Preta, que teve uma ninhada de 9 cachorrinhos, uma de 10 e uma de11. Entre os trinta, havia um que era menor, mais magro e não conseguia mamar. Ela o colocava no sofá para ele conseguir o leite. Quando eles aprendiam a comer, Beth conprava ração , batia no liquidificador com água e colocava em uma bacia para todos comerem de lá.
Com dois meses os cães iam para seus futuros donos, e como era professora, fazia uma lista com o nome dos alunos que queriam ficar com uma das “bolas de pelo” e colocava os maus comportados para o final. Para ter certeza que as casas de alguns não era pequena, ela ia visitar, para fazer a “lista final”. Levava de 3 em 3 cachorrinhos para secretaria da escola e no final da aula, as alunas os escolhiam e levavam para casa.
Atualmente ela tem três netas: uma filha de Joana, a Cecilia e duas filhas do Pedro Dora e Alice . Mora em uma aconchegante casinha, não mais na Granja e desde sempre aqui.
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